sexta-feira, outubro 29

..:: Saudade ::..

O mundo sabe o quanto eu reclamo das produções televisivas contemporâneas. Que eu vivo falando que a qualidade de agora já não é tão marcante e intensa como era nos anos 80/90. Que a Globo tem cerceado tanto a criatividade de seus autores que as novelas de hoje parecem mais repetições e mais repetições.

Por isso mesmo, é bom quando encontramos pessoas que de alguma forma compartilham com as mesmas opiniões que eu tenho. Criatividade não pode ser cerceada. E eu tenho certeza que, se a globo parasse com esse falso moralismo que ela tem imposto na sua grade de programação, os programas seriam muito mais interessantes que os BBB’s da vida, ou os programas sem criatividade nenhuma que um Zorra Total, por exemplo.

Eu sou de uma época em que se via (E ria) com TV Pirata. Que se sentia retratado ao ver “Vale Tudo” (Que pode provar o que eu estou falando pelos números que o canal apresenta todos os dias na hora da novela).

Mas eu vim mesmo para falar de uma das melhores novelas que já passou na televisão brasileira. E essa novela se chama Kananga do Japão. Sair com o Heddy tem dessas coisas. Quando nós dois começamos a conversar, sempre a conversa termina com alguma obra prima.

Primeiro estávamos falando de Nelson Rodrigues. “Engraçadinha” está sendo reprisada e estávamos falando para o Carlos e o Kaio o quanto o texto do Nelson Rodrigues é brilhante. Afinal de contas era TEXTO. E não a ideia de texto que temos hoje. E acabamos falando de novela, filmes... Kananga.

Kananga foi uma novela de 89 (Se não me falha a memória) que era exibida na extinta TV Manchete (Saudade demais dessa emissora). Era basicamente uma história de amor. Alias, era uma história de amor entre a Dora (Christiane Torloni) e o Alex (Raul Gazola) ambos novos, bonitos e talentosos. A novela se passa entre os anos 20 e 40 durante o Estado Novo do Getúlio Vargas e aborda os temas daquela época. Segunda Guerra, Intentona Comunista, enfim...

Falar da Kananga é falar de poesia. Um texto maravilhoso, dificilmente eu vi uma novela com um texto tão bom, tão bem escrito quanto Kananga. Uma direção estupenda é uma aula. Os cenários, figurinos... Acho que não há, na teledramaturgia brasileira algo tão completo. Eu lembro que eu ficava acordada até tarde para poder assistir. Creio que tenha sido a primeira novela que eu realmente acompanhei do início ao fim. As novelas da Manchete tinham esse poder sobre mim... Me faziam ficar presa a elas até o final.

E lembrando dela, torna impossível a não comparação com as que estão sendo exibidas agora. A queda de qualidade é imensa. Não há mais no país produção como aquela. O que mais me marcou, além das interpretações dos três protagonistas, foram os cenários. Eu lembro que a gafieira Kananga do Japão (onde acontecia a maior parte das cenas da novela) me passava algo utópico de um Rio de Janeiro que nunca existiu (por mais que eu saiba que tenha existido) e a casa do antagonista me vem à cabeça uma escadaria onde a Christiane descia, me faz perder o fôlego até hoje.

E claro... Novela de Época. Luiz Carlos Prestes e toda a sua trajetória. Olga Benário e a sua luta contra o nazismo... Estado Novo... O tom lúdico que a novela me passava... São coisas que não se vê mais... Em novela nenhuma. Não há mais um texto tão envolvente que faça com que você viaje até a época em que ela está sendo ambientada. Kananga do Japão fez isso. E eu tenho quase que absoluta certeza que faria se a novela fosse reprisada.

O Brasil precisa de textos como o dessa novela. Não cópias mal feitas de sucessos do passado. Não cópias de péssima qualidade devido ao fato de o mundo ter se tornado “politicamente correto”. A teledramaturgia brasileira só é brilhante por que em seus textos os tons politicamente corretos ficavam de fora. O que o país que ver é ser retratado nas telas... O que o brasileiro quer ver é poesia em forma de imagem. Tenho certeza que os números das novelas de hoje seriam muito maiores se não houvesse tanta polidez nos textos dos autores. Nem na ditadura militar havia tanta censura. Os textos eram fortes, intensos e por que não falar... Inteligentes.

A inteligência do brasileiro não diminuiu, o que está acontecendo é que ela esta sendo subestimada por pessoas hipócritas que acham que a vulgaridade chama mais a atenção do que a sensualidade. Não chama, desculpem, mas não chama.

Baseiem-se nos textos de Nelson Rodrigues, no roteiro de Kananga do Japão... Glória Peres, lembre-se do seu tempo de liberdade criativa, faça novamente o que você sabe fazer de melhor. Você é discípula de uma das mais cultuadas autoras de novelas, não se deixe abater por essa censura branca que pairou sobre a teledramaturgia brasileira. Você é a última remanescente dos grandes autores de novela. Benedito Ruy Barbosa... Por favor, traga mais do seu brilhantismo de “Pantanal” para as nossas vidas. E não venham me falar que são novelas velhas. O SBT reprisou ano passado Pantanal e os números da novela foram surpreendentes. O brasileiro quer sim qualidade na sua TV. Ele apenas não sabe onde achar.

Enfim... Nostalgias de uma pessoa que sente falta de uma trama envolvente, de personagens inesquecíveis e textos marcantes.

Beijos Uivantes.

Ass. Lobinha.

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