E tudo,
desta vez, estava bem. Quer dizer, agora ela havia chegado no ponto onde sempre
quis e estava meio perdida de qual caminho seguir – na verdade, claro que isso
a estava preocupando, ficar sem norte nunca foi uma opção para ela – mas agora,
ela ao menos sabia que encontraria o seu caminho; no tempo dela, na hora dela,
do jeito dela, ela encontraria o caminho, e tudo que havia passado, aprendera a
não ligar para o que os outros insistiam em falar. Ela simplesmente aprendeu a
ignorar tais dizeres. E tudo porque sabia que o pior já havia passado, pelo
menos por enquanto.
No ritmo
dela, aprendera a não “ouvir” o olhar dos outros em sua direção. Ela conseguira
isso e era motivo de muito orgulho para ela. Lá no fundo, era claro que ela
estava com medo do que poderia vir pelo futuro, já que todos sabem que o futuro
é uma “astronave que tentamos pilotar”, sem muito sucesso. E isso dá medo, e
mesmo quanto a isso ela estava tranquila, pela primeira vez na vida, ela estava
tranquila. Quanto a isso.
Tudo estar
bem era o problema, ao menos para ela, pois era justamente quanto as coisas
estavam completamente bem que as suas maiores feridas foram feitas, pois seu
mecanismo de defesa era quase que totalmente inexistente. Era quanto ela ficava
mais exposta a tudo que se machucava. E mesmo sabendo disso, era impossível não
ficar exposta, não se sentir “segura” quando as coisas estavam bem. E é
justamente nessa fase que um velho conhecido dela aparecia... Ele fica por lá
por dentro dela, lá no fundo, no cerne do coração dela, ele está lá, escondido,
tentando se expandir ainda sem muitas forças para isso.... Ela o nomeara de
Senhor Medo.
O Senhor
Medo era tão poderoso que todos os outros medos dela sentiam medo dele. E ele
era poderoso porque tratava de um segmento da vida dela que ela mais se sentia frágil:
as pessoas. Pessoas que ela conhecera no meio do processo (E algumas até mesmo
antes do grande processo – aquelas que permaneceram, claro) e que ela nutria um
amor incondicional. Não amor sexual, não, esse amor, frente ao que ela sentia
era banal. Esse amor, ela costumava dizer, era algo que nem mesmo o maior amor
do mundo seria capaz de explicá-lo. Era uma força tão poderosa que ela
carregava por tais pessoas que sentia, muitas vezes, que seria sufocada por ele
de tão forte. E o Senhor Medo atacava esse ponto, implantando no coração dela,
a sombra da perda.
Finalmente
ela conseguira tudo que sempre havia sonhado, e conhecido pessoas que ela sabia
que estão dentro do lugar mais privilegiado do seu coração e essa sombra
teimava em querer entrar nesse lugar há muito tempo vago, mas que agora, havia
inquilinos dignos dele.
Tudo
estava bem e era exatamente por isso que o Senhor Medo teimava em romper o
lacre. Todas as suas lágrimas durante aquele tempo eram resultado do Senhor
Medo... Medo de perder... Tudo! Ela não estava mais disposta a abrir mão de
nada nem ninguém. Ela não tinha mais forças para isso. Durante toda a sua vida,
ela abriu mão de coisas e pessoas que ela queria que hoje estivessem por perto,
a última vez, ela caiu tão fundo que chegou a pensar que jamais conseguiria
sair do buraco que estava. Um buraco chamado vazio... Um vazio que a sufocava.
As noites
mal dormidas, os choros abraçada na almofada, os pensamentos ciumentos
horríveis (E ela não sabia lidar com ciúmes, era algo que ela não sabia lidar)
e a insegurança constante, tudo isso
era o Senhor Medo tentando se expandir.
Ela não poderia
mais abrir mão de ninguém na vida dela, a última vez que fez isso, ela sentiu
seu coração queimar e jurou nunca mais sentir isso. Ela não abriria mais mão
daqueles que guarda no coração em um lugar especial.
Mas, por
enquanto, tudo estava bem. E isso bastava.
Vanessa Carvalho – Autoral.
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