Eles tinham um relacionamento intenso: na cama e fora dela. Dificilmente
brigavam, e sempre se davam bem. Seus amigos, um casal mais chegado, na
verdade, viviam afirmando que eles eram uma espécie de almas gêmeas.
Quando se fala de almas gêmeas logo vem à cabeça pessoas completamente
iguais. Eles não eram assim, tinham suas particularidades, ele era sempre mais
extrovertido, e ela sempre mais fechada, mas se completavam de uma maneira
assustadoramente simétrica.
Mas, naqueles dias, eles estavam distantes um do outro. Não fisicamente,
mas em suas almas; as coisas estavam diferentes. Ambos estavam ainda se dando
bem, mas eles sabiam que não era exatamente a mesma coisa. Há pouco tempo
haviam discutido besteira, como sempre, mas uma besteira que estava custando
suas tranquilidades.
Ela estava voltada para o trabalho. Quando isso acontecia focava sua
concentração para não ficar pensando besteira, disso ela era rainha.
Racionalmente, sabia que não havia nada de errado, mas seu coração teimava às
vezes, em querer pregar-lhe peças. Então, para não exagerar ou ser injusta,
focava sua concentração nas planilhas que tanto odiava. E estava dando certo.
Estranhamente, estava conseguindo raciocinar sobre tudo, até sobre a
estranha sensação de que eles estavam separados. Logo ela iria encontrar uma
forma de mudar aquela sensação que a estava fazendo perder o sono. Por dias
acordava e o via dormir. Ela adorava ficar admirando a sua expressão calma e
sorridente ao dormir. Sem ser metida ou convencida, sabia que ele estava
sonhando com ela. Ela era a garota dos sonhos dele, disfarçada de todas as
mulheres que já passaram pela sua vida.
Levantou-se. Sabia que não iria conseguir voltar a dormir, e se
permanecesse deitada iria acabar por acordá-lo. E ela não queria isso, não
ainda. Foi ao banheiro para tomar um banho rápido. Havia adquirido essa mania
(como ela falava) dele. Já iam completar aniversário de namoro e ela estava
guardando aquela roupa para a ocasião especial. Mas ela sabia que, estando com
ele, qualquer ocasião era especial. Lembrou-se de uma noite em que ele a levou
para jantar... E outra no cinema. Sorriu ao lembrar ambas.
Vestiu a roupa que havia olhado na vitrine. Sabia que aquela roupa seria
dela. Fora feita para ela. Deixou seus cabelos soltos. Poucas vezes ela se permitia
fazer isso, mas hoje seria a mulher apaixonada, nenhuma personagem estaria
entre eles. Ela estava sentindo falta disso. Queria que ele fosse seu noivo
apenas, sem personagens atrapalhando. Ao chegar ao quarto, ele ainda estava dormindo,
sonhando e sorrindo. Ela quase se sentiu culpada por ter que acordá-lo...
Quase.
Chegou perto dele e lentamente foi passando a mão em suas costas. O
contorno de suas costas na camisa a deixava completamente enfeitiçada. E ela
sorriu por ver que ele, aquele homem deitado, dormindo em sua cama a amava
incondicionalmente. Ele era o seu anjo, seu protetor, seu amante, seu amor. E
ela não queria mais nada. Ela estava completa.
Ele, ao sentir o delicado toque de suas mãos em seu corpo acordou. Como
a visão que ele teve fora dela, não ficou chateado por ter sido acordado de um
sonho com ela. A realidade de tê-la era muito mais interessante. Ele a tinha,
sonhava com ela constantemente, mas era na realidade que ele se completava. Era
na realidade que ele sabia que iria encontra-la ao acordar.
Eles se olharam. Sua sintonia era tão perfeita que eles, naquele
momento, não precisavam de palavras. Elas estragariam tudo. Ele se sentou,
encostando-se à cabeceira da cama olhando para ela. E ele sabia como agradá-la.
Sabia que quem estava ali era a noiva apaixonada, que o amava inteiramente, e
não qualquer personagem. Ela estava sorrindo olhando apaixonadamente para ele.
Ele sabia que aquela noite seria uma noite romântica. Aproximou-se,
então de seu rosto. Ficou por um tempo afagando seu rosto entrelaçando seus
dedos em seus cabelos soltos, macios, e molhados. Ele gostava quando eles
estavam molhados. Lentamente se aproximou de seu rosto e delicadamente lhe
beijou os lábios. Logos os olhos dela se fecharam. Sabia que aquele beijo se
tornaria mais intenso.
Logo ela parou de
pensar. Logo ela estava de volta para a cama. Logo eles estariam um nos braços
do outro. E logo aquela sensação, aquela estranha sensação de distância
sumiria.
Vanessa Carvalho.
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